Tuesday, August 28, 2007

a casa

Isto de ser desorganizado não deixa de custar algumas tolhas limpas para o banho, uma conta não paga a tempo, a gaveta que não abre e uma doença de pele no chão onde assentam os pés da mesa da sala, servi dois ou três jantares, faltam cadeiras, não sei se será essa a razão de não ter servido mais.
A minha casa é só o lugar onde me encontro quando lá estou, se abasteço o depósito do carro o que sinto não anda longe daquilo que sinto em minha casa, gostava de amar um candeeiro mas não consigo, acendo a lâmpada e já é luz suficiente…
É simpática logo pelas paredes que tem, é o que dizem, quando lá entra alguém, percebo mas não dou grande importância, continuo infinitamente a gostar mais da casa de banho e do chuveiro que lá mora.
É um defeito meu, talvez seja um defeito meu, não valorizar aquilo a que me condenei nos próximos quarenta anos, como se pudéssemos contratar a vida dessa maneira com a única lealdade que nos chega por escrito todos os meses.
Bela varanda, não sou eu que o digo, com vista para o hospital, não sossega nem melindra, uma via rápida em frente porque rápida não incomoda, quem vive junto a uma linha-férrea acaba por deixar de ouvir o comboio, não é o meu caso.
Ouço o comboio mas não a casa.

4 comments:

Anonymous said...

Arrancaste-me uma gargalhada com a ultima parte do texto...bem visto!

Quanto ao seu conteudo na integra do texto que hoje nos deixas, nao acho que seja um defeito.

Apenas algo sem apegos sem desconcertos, sem preconceitos de uma sociedade...
...nada que recorde um espaço, sendo que a humanidade que fará a sua decoração momentanea trará valores muito mais válidos a serem vividos, amados...para quê amar um cadeeiro, se podemos amar (n)o chão...

Beijoss

odeusdamaquina said...

E eu, na estação desabrigada dos afectos, não vejo comboios, só sombras esqueléticas de um passado carcomido, numa solidão demaisado ruidosa.
Em Barca d'Alva - no fim do mundo entre o Douro e a fronteira com Espanha. (Barca d'Alva era a antiga estação terminal do Comboio do Douro, que saía do Porto. Hoje, termina no Pocinho, ao pé de Vila Nova de Foz Côa. Entre o Pocinho e Barca d'Alva restam 32 quilómetros de desolação, uma paisagem magnífica, eu e o meu escanzelado corpo ao sol, por entre estes trilhos da minha aventura solitária para a vida, para sentir que estou colado ao mundo e à imaginação! Deveríamos todos percorrer estes trilhos do silêncio. Nem que seja para mais tarde podermos gritar a plenos pulmões: Filhos da Puta da CP! o dinheiro não é tudo! Malfadada Rentabilidade económica!)
Adeus, vou continuar em viagem. Agora rumo a Freixo de Espada à Cinta, terra do poeta Guerra Junqueiro! Arrivedecci!

Miguel Patrício said...

Amigo Mário, escusado será dizer-te vive a viagem, sei que a vives, como quem olha para o mundo e diz de si, não tenho dúvida alguma, estás na carruagem certa.
Meu bom e recente amigo, sei que o posso dizer.
Até breve, na tua vinda ao Barreiro beberemos um ou dois copos de vida, sempre.
Abraço para ti.

odeusdamaquina said...

Sempre, sempre!
Com a carruagem carregada de sentimento!