Wednesday, July 9, 2008

A cadeira.

Estava sentado junto à entrada da cozinha numa cadeira de plástico, inocente de verde, ainda mais clara, suficientemente longe da janela, da vida de uma janela, quadro de ombros que sobeja, sempre que para lá se olha, sobeja.
Uma perna ao lado da outra, juntas, calças de só ter joelhos por baixo, as pernas ainda, as duas, ao fundo os pés nus, dois pentes de pele e carne e ossos, penteando o chão da cozinha em cabelos suaves de nada.
Quando se tem tempo é assim, os dedos mexem-se numa irmandade descalça, ouvem-se uns rumores longínquos de perto e achamos que estão a brincar connosco, ainda brincam connosco, como na praia os miúdos desconhecidos de se conhecerem, brincam.

Nunca foi de milagres, a agilidade assim diz, como o cotovelo a meio do braço o dobra e estende. Um olhar para tudo, a erva que rompe da terra e se ouve na cozinha, a mesma maternidade.

Bateram à porta, não um nó de dedos, um fio verde com olhos de poeira, sem inicio depois da porta, cega de corpo, decidida de saber porque veio aguda de força, rastejando por entre os cabelos, acariciando os pés e congelando os pequenos ossos, subiu aos joelhos dividida de pressa, como um mergulho no mar foge da dor de um incêndio,
acometeu cintura ao corpo dividido, fez-se cadeira, verde, inocente, ainda mais clara,
a pele de onde não mais desceu.