Sunday, June 8, 2008

Eu gosto que Portugal ganhe, porque quando Portugal ganha o meu marido beija-me, passa as mãos pela cabeça dos miúdos, chama-me pequenina e eu gosto.
Já tem acontecido depois de um jogo desses, em que Portugal ganha, sairmos para comer amêijoas e ele beber mais umas cervejas, os miúdos divertem-se, usam-lhe o colo e ele fá-los rir, gosto tanto de os ver assim.
Tenho pena que a equipa não entre mais vezes em campo, com aquela gana de vencer,
eles que ganham tanto dinheiro, afinal de contas é só uma bolinha que terão de pôr lá dentro, soubessem da felicidade do meu marido e acredito que nunca mais perderiam um jogo.
São os carros na rua a cumprimentarem-se no trânsito, as palmadas nas costas dos que nem bom dia no elevador, as estátuas coloridas e os outros ainda mais pequeninos a correr, transpirados sobre a porta do café, os nomes dos jogadores em suor na testa.
Temos Carlos, temos, ainda chega para pedires mais uma, que te segure a boa disposição, depois saímos todos juntos, ele no meio, de braços grandes a segurar-nos,
uma selecção.

Wednesday, June 4, 2008

Os amigos doces

Os amigos doces viajam com as costas cobertas de pó, num comboio do qual a maioria se distraiu, calças coçadas pela terra e a pele ainda viva de atenção.
Os amigos doces sorriem para dentro uns dos outros, engolem e devolvem com a mesma disponibilidade o prazer de estar juntos, mãos nos cabelos, e os brincos delas a dançar candeeiros suaves nas orelhas.
Artur lava os olhos na luz de uma janela, molha os dedos na boca, ensaia as pestanas para o acerto que o coração lhes dá, frente e lado, todos dormem ainda o documento de sono que a felicidade abriu nos rostos, pode assim, uma vida congratular-se por ouvir um comboio, a alma de um comboio, como ferro feminino, joelho de uma perna a deslizar na erva, uma manhã que tinha tudo para nela se ter ficado.
As pestanas colaram-se, não lembra a ninguém dizem, transportar saliva para os olhos,
os joelhos não voltaram a tocar a erva, e o comboio não mais se ouviu.