Wednesday, June 4, 2008

Os amigos doces

Os amigos doces viajam com as costas cobertas de pó, num comboio do qual a maioria se distraiu, calças coçadas pela terra e a pele ainda viva de atenção.
Os amigos doces sorriem para dentro uns dos outros, engolem e devolvem com a mesma disponibilidade o prazer de estar juntos, mãos nos cabelos, e os brincos delas a dançar candeeiros suaves nas orelhas.
Artur lava os olhos na luz de uma janela, molha os dedos na boca, ensaia as pestanas para o acerto que o coração lhes dá, frente e lado, todos dormem ainda o documento de sono que a felicidade abriu nos rostos, pode assim, uma vida congratular-se por ouvir um comboio, a alma de um comboio, como ferro feminino, joelho de uma perna a deslizar na erva, uma manhã que tinha tudo para nela se ter ficado.
As pestanas colaram-se, não lembra a ninguém dizem, transportar saliva para os olhos,
os joelhos não voltaram a tocar a erva, e o comboio não mais se ouviu.

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