Sunday, November 25, 2007

O lago

Uma cara, porque a cara é de cima para quem está de pé, o que se procura quando em trânsito vamos, corpos parecidos e logo luzes nos lugares angulares nos dão o erro, não eras tu, mais uma vez não eras tu, mas eu sigo ainda mais circular ao teu encontro, raso ao coração como um isqueiro de outro fogo, ali vivem os comboios, dormem e acordam, chegam e partem, dali vem o meu casulo.
A oriente me desnudo, sem a máscara ancestral de tudo, o tempo do meu governo sou eu, é o que te quero dizer, para diante…
Enquanto houver uma migalha de sol, uma mingua de lua, uma praia secreta para um coração que explode ao ver-te, estarei salvo, com os olhos cobertos de fumo, a língua de cortiça, os lábios de pano e as pernas últimas de chegar mal articuladas, ainda assim a paisagem que me foi anterior me salvará.
A partir de hoje será assim, impulso apenas, demorado só para o essencial, e o essencial és tu, vida que não sei quanto dura, eu de dentes de oiro sob um céu de cinza, sangue a rasgar o negro, gruta urbana de sorrisos incrustados, lágrimas de gelo, escuridão ferida por uma faca de luz, coração de escuteiro ainda.
Um lago, no mais profundo da terra, margens de areia ligadas que a água acaricia, o teu corpo livrando-se, da superfície e da mágoa, o teu corpo dobrando-se na água, entrando
livre como um caminho, afastando-se, afundando-se, iluminando tudo o que ferve de luz, o teu corpo alvo, de seta e de cor, agora sim, todos os significados, tudo quanto é mensurável, jardins diurnos e nocturnos, flores inacabadas, mãos a três dedos do rosto,
palavras escritas no dorso dos peixes, azul de voar para dentro de um abecedário, deficiente mental sorve gelado de menta, tudo, tudo faz sentido e ainda não chega para completar o que jamais se completa.
Não os mando à merda porque não vale a pena, não merecem, é uma palavra muito preciosa, vão antes com as estrelas e beijem-se muito, Mira d’aire talvez lhes sirva, tem qualquer coisa de Francês ao contrário, muito subterrâneo.
Mergulha amor, mergulha tu, como ainda há pouco porque me distraí, subi antes de tempo para o nojo, desculpa, nada como o teu coração húmido, chamei-te terra e tu subiste, soubessem eles a existência de um sol e uma lua de bolso sobre esse lago,
ainda bem que não sabem, fiquem nas suas piscinas, é lá que terão de viver.

Monday, November 19, 2007

Tomás

Soube que casaste, tens um filho chamado Tomás, trabalhas e vives no lugar onde nos deixámos, sinto-te feliz, daqui sentado sinto-te feliz, não deves ter ido de noiva, talvez de calças de linho, camisa e dois botões por casar, agora um anel no dedo dele.
As rugas dos olhos um pouco mais fundas e novos cabelos brancos cobertos de tinta,
continuarás a passar a língua pelos lábios, movimentos esses que dificilmente nos abandonam, acredito que estejas assim, mais agora não sei…
As mulheres gostam de ser mães, eu conheço-te a ti, imagino um sol de fraldas todos os dias, e os teus olhos grandes resistentes à luz.
Leve na vida como quem apaga ruídos desnecessários, pés pequenos, seios de menina, escuros no centro, lembro-me de te rires com lágrimas, de chorares denunciando-te, lembro e sinto-te feliz daqui sentado.
O teu cheiro não, já não é coisa para mim, o barro da memória, esses dedos sim,
como um liceu de saudade a sorrir baixinho na formatura, é desse modo que me chegas de vez em quando, abraçamo-nos de longe e queremo-nos bem.
Enquanto for vivo saberei de ti, num copo de água ou num oceano maior, não importa o lugar onde me encontre, os dias nasceram de frente, eu e tu, os dias continuarão a nascer de frente, é isto que sempre saberei de ti.

Monday, November 12, 2007

Sexo e cigarros.

Acabei há pouco os cigarros, acabei há pouco de tentar fazer sexo, fumei o ultimo depois de o ter tentado fazer, ainda me deitei com ela, beijo para cá, beijo para lá, em todos os lugares do corpo, se é que isso é possível, em todos os lugares do corpo, ainda acredito que seja, um dia destes, em todos os lugares do corpo.
Nunca escrevo sem fumar, não sei muito bem porquê, um atrás do outro, talvez me estimule, para não lhes dar agora muita importância, digo que talvez me estimulem,
os cigarros, telefonei-lhe, andava por perto, veio, sim, é assim vazio como isto, tomou banho e foi à vida dela, o engraçado é eu achar que não foi assim tão desiludida comigo, quanto eu fico por vezes, confesso.
Precisa de amor, e esse não lho posso eu dar, pede que a abrace, diz querer sentir o meu corpo por cima do dela, sentir-me…
como se isso fosse possível, sem que eu me sinta a mim.
Tenho a sensação que vai voltar mais vezes, ou telefona-me ela, ou ligo-lhe eu, é assim.
Que raio de solidão esta, incendiária, trincheira de corpos feridos de amor ou falta dele,
nunca poder dizer que te amo, e tantas vezes não conseguir sequer foder-te, que amo foder-te, não poder dizer-te o que sou, de ordinário modo, ou outro, não poder dizer-to porque não sinto.
Abraço-te mas o sol não nasce aí no ombro onde arrumo o nariz, nem na tua vagina fui feliz, desculpa, mesmo que não seja necessária, desculpa, podíamos ter falado, claro que podíamos ter falado, em vez de, oh sabe-me tão bem aí, passou a fúria liquida como um carro sem gente pelo teu rosto, que sucesso o meu, que poder, que merda, limpei um dos teus olhos com uma almofada, depois não à boca que valha, afundo a cara no lençol e lembro-me do cão cansado que aceitou o tapete, porque não o querem dentro de casa.
Merecíamos os dois, tu um monstruoso pénis que te chicoteasse, eu um clítoris gigante atravessado na garganta, merecíamos os dois um pouco mais do que isto, até logo, vemo-nos depois, quando a tesão voar no corpo como uma abelha na sala.
Gostava de deixar definitivamente de fumar, eu que gosto infinitamente de fumar, gostava, ser mais profícuo em tudo, acordar e perceber que há outras coisas por nascer ainda, erecções que não aquela, números de telefone que não aquele, outros assuntos pelo menos, gostava que soubesses que te respeito, estranhamente, que não sou feliz, nem quero, apenas outra lente, outra visão nos olhos e na pele, no coração, deixa-me dizer-te que estou de facto perdido, mas ainda muito longe de me perder, quando te ligar será para te dizer, bom dia, continua, amo-te sem te amar, adeus, gostava de deixar os cigarros de vez, só Deus sabe o quanto gosto de tudo o que lhes está agarrado, agarrado aos cigarros, uma vida, agarrado aos cigarros, ainda é cedo digo para mim, ainda que morra amanhã, ainda é cedo, o amor ainda vai alto, claro que sim, um dia chegarei lá, e sem me dar conta, amo-te, gosto tanto de entrar em ti, de morrer nos teu lábios e usar os meus como almofada se nos teus olhos…desculpa, amo-te.